No dia 27 de maio de 1858, em Pianello Lario (Como, Itália), nasceu a última dos 11 filhos de Alexandre e Rosa Mazzuchi. Deram-lhe o nome de Dina. Aos três anos ficou órfã de pai, um pequeno industrial da seda. A menina foi educada pela irmã mais velha, Marcelina, e desde cedo aprendeu a arte de fiar. Mas Marcelina, jovem piedosíssima, que sob a orientação de São Luís Guanella, seria cofundadora do Instituto das Filhas de Santa Maria da Providência, convenceu os irmãos a enviá-la ao Instituto das Irmãs Canossianas de Gravedona para que continuasse os estudos, prestando ao mesmo tempo serviços domésticos.
Ali permaneceu por seis anos, que a marcaram profundamente. Dina admirava a vida das irmãs religiosas. Impregnou-se de seu espírito e viveu dias de intensa piedade. Acreditava ser chamada para a vida religiosa, conforme o programa de Santa Madalena de Canossa, que proclamava: “Deus só!”. Devido, entretanto, ao seu caráter tímido e reservado, inclinado ao silêncio e à contemplação, mais do que à ação, Dina foi considerada inapta para aquele instituto e voltou para a família.
Entrementes, em Pianello Lario, o pároco, Padre Carlos Coppini, havia agrupado jovens numa Pia União de Filhas de Maria, sob a proteção de Santa Úrsula e Santa Ângela Mérici (10 de julho de 1871), na qual Marcelina se tornara superiora. Com algumas daquelas jovens foi possível ao pároco inaugurar, em outubro de 1873, um providencial albergue para idosos e crianças abandonadas.
Regressando à terra natal, Dina foi aconselhada pelo pároco a ingressar no albergue. Ela o fez sem muito entusiasmo, pois aquela piedosa casa, que ela não conhecia muito, parecia-lhe imersa em uma grande atividade com as crianças, os anciãos e na ajuda aos necessitados da região, enquanto ela preferia uma casa toda dedicada à oração e à contemplação. Mas, em 27 de outubro de 1878 ela emitiu a profissão religiosa, tomando o nome de Clara.
Em julho de 1881, o pároco faleceu, vindo substitui-lo o Padre Luís Guanella, que passou a dirigir as religiosas das quais fazia parte Clara Bosatta. No ano escolar de 1881/82, Clara completou a preparação para diplomar-se professora do curso elementar, sem poder prestar os exames. Foram-lhe confiadas as mais variadas tarefas, entre as quais a de Mestra de Noviças. Dedicou-se à educação das órfãs com maternal solicitude.
Como pároco, Luís Guanella se dedicou em transformar a Pia União das Ursulinas em uma congregação com o título de Filhas de Santa Maria da Providência. Dedicava-se também à formação das religiosas, passando a ser diretor espiritual de Irmã Clara, guiando-a na via da contemplação mais alta, especialmente da Paixão de Cristo, e fazendo com que ela se empenhasse no serviço da caridade com os necessitados. Irmã Clara portou-se sempre com humildade, dedicação e abnegação até o heroísmo. Além do intenso trabalho no albergue, ajudava na paróquia ensinando catecismo a crianças e adolescentes, e visitava os doentes em suas casas.
Em 1885, o Padre Lourenço Guanella, irmão de São Luís Guanella, pediu que as irmãs Marcelina e Clara, com mais uma irmã, abrissem uma nova casa em Ardenno. Não lhes faltaram trabalhos e sérias dificuldades. Foi uma experiência que preparou Irmã Clara para uma nova tarefa: em maio do ano seguinte, foi-lhe confiada a direção da Casa da Divina Providência, que se tornaria a casa-mãe da obra de São Luís Guanella.
Um carisma em comum
Deus em seu desígnio de infinito amor, doou ao padre Luís Guanella, fundador da Família Guanelliana, o Carisma da Caridade. Deu-lhe um coração capaz de amar e de se fazer irmão e pai dos pobres. Irmã Clara também recebeu de Deus dons especiais. “Deus era o tudo de sua vida”. Era decididamente voltada para Ele em seu ser e em seu agir. Por vontade de Deus os dois se encontram e juntos abraçam a missão de viver para Deus e servir os mais pobres, reconhecendo neles a imagem do próprio Jesus. “Todas as vezes que fizestes isso a um destes menores, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes”! Conforme Evangelho de Mt 25,40.
Irmã Clara residia na cidade de Gravedona, para concluir seus estudos e obter o diploma de professora, quando o padre Guanella chegou a Pianello, no mês de novembro de 1881. Guanella, muito interessado no pequeno Instituto das religiosas, ao qual intuía ser o embrião da sua futura obra, tomou a iniciativa de entrar em contato com Irmã Clara e o fez, através de sua irmã Marcelina, enviando-lhe como presente de Natal, dois livrinhos por ele escritos e recentemente publicados.
Clara ficou muito feliz pelo presente recebido e ainda mais pelo interesse que o novo pároco demonstrou para com ela. Expressou sua gratidão escrevendo-lhe uma cartinha de agradecimento no dia 02 de janeiro de 1882. Foi um pequeno texto, muito simples e formal, que expressa o desejo de “que o senhor pároco pudesse fazer-lhe uma visita que lhe permitiria conhecê-lo em pessoa” (C11). É a primeira carta de irmã Clara ao padre Guanella e esta marca o início de um rico relacionamento e uma profunda sintonia espiritual e missionária entre eles, produzindo muitos e bons frutos de bem às pessoas mais sofridas das comunidades onde atuavam.
Importante registrar que Irmã Clara, após ter enfrentado vários desafios neste período, com prolongados e intensos estudos, cumprindo as várias etapas obrigatórias para sua formação como professora, foi surpreendida por um documento do setor da Educação, cancelando a prova final exigida para obter o diploma de professora das séries iniciais. Foi um duro golpe para todas as jovens estudantes. As irmãs Canossianas, onde irmã Clara estava hospedada, insistiram junto aos órgãos competentes de educação, para que fizesse uma exceção, permitindo a realização da prova final às estudantes preparadas, mas tudo foi inútil.
Ela, mais uma vez, teve que pronunciar o seu doloroso “Sim”. Voltou para Pianello em agosto de 1882, sem o diploma desejado e necessário para o serviço da educação das órfãs acolhidas no Albergue. Clara não desanimou, mas com a força da graça divina acolheu novamente o plano de Deus sobre ela, decidindo fazer sempre e em tudo a Sua vontade. Reassume com renovado empenho suas atividades educativas e apostólicas, dando o melhor de si, tanto no Albergue como na comunidade paroquial.
As irmãs da comunidade, as órfãs e jovens da paróquia acolheram irmã Clara de braços abertos e expressaram seu carinho e apoio para a nova etapa de sua vida. Irmã Marcelina, responsável pela comunidade religiosa das Irmãs Ursulinas, conhecendo um pouco mais a vida e as atividades do Padre Guanella, percebeu suas grandes virtudes, seu empenho de pastor, sua dedicação e proximidade para com os pobres, e convidou-o para assumir a formação e a direção espiritual do pequeno grupo de religiosas. Ele aceita de bom grado se dedicando intensamente a esta missão.
Observações de São Luís Guanella
Guanella deixou registrado na biografia da irmã Clara os principais passos da formação às irmãs Ursulinas, as futuras Filhas de Santa Maria da Providência. Irmã Clara, muito empenhada, sobressaía-se entre elas. Assim relata padre Guanella: “Irmã Clara demonstrava-se faminta da divina Palavra. Esperava com intenso desejo o dia das palestras e as apreciava em seu coração. Era a primeira a chegar. Imóvel, prestava a máxima atenção. Com esforço conseguia conter as íntimas moções da alma. Contrastavam nela sentimentos de dor, unidos a sentimentos de alegria íntima. Demonstrava especial interesse para com a doutrina, os conselhos evangélicos e os ensinamentos de Santa Teresa de Ávila, os quais foram explicados mais difusamente naquele ano, devido às celebrações do terceiro centenário de sua morte” (DG92).
Ele continua: “A Serva de Deus, após ter escutado a explicação da Palavra divina, sempre se esforçava, com anotações particulares e com outros atos, em traduzir na prática, o que ela escutava; de maneira particular quando se tratava de conferências às religiosas, principalmente nos exames práticos dos Exercícios Espirituais. Quero também acrescentar que por efeito da edificação que a Serva de Deus me dava, comecei a compor e publicar um catecismo religioso, sempre pela inspiração que me vinha dos exemplos e dos fatos notáveis da vida espiritual da Serva de Deus. Compus também o livrinho ‘No mês das Flores’, como fiz um estudo ou resumo das obras de Santa Teresa, para publicá-lo como alimento da vida religiosa” (109).
Clara preparava-se para os Exercícios Espirituais e estimulava toda a comunidade. Assim dizia às suas coirmãs: “Estes dias de retiro são preciosos para poder descobrir os pequenos alfinetes dos nossos defeitos que nos impedem de voar até Deus. São dias preciosos para estimular intimamente o coração ao amor de Jesus Cristo” (DG93).
Filhas de Santa Maria da Providência
Um trecho do caderno de formação das Filhas de Santa Maria da Providência relata: “São Luís Guanella orientava Clara e as irmãs da comunidade a um autêntico heroísmo de virtude. Quando consideramos que Pianello é o “berço” do Instituto não significa apenas que a Congregação nasceu ali, mas quer afirmar acima de tudo que em Pianello, aconteceu o enxerto do espírito guanelliano no grupo das irmãs iniciadas pelo Padre Carlos Coppini. Assim foi o início da fundação, e com ele toda a congregação recebeu as primícias da formação guanelliana. Aqui foram colocadas as bases, os alicerces, principalmente espiritual e apostólico da família religiosa. O grupo das irmãs de fundação tem a Graça de participar do projeto espiritual e apostólico do Padre Guanella”. (As FSMP – Caderno de Formação Nº 7 – pág. 55-56).
Guanella, o “fundador” está plenamente em ação. Poderíamos falar em uma verdadeira “refundação”. Na verdade, o pequeno grupo estava a ponto de dissolver-se. A intervenção do Padre Guanella foi providencial, pois lhes dá novas energias, novos ideais e a força do Carisma que nele atua se comunica também às irmãs. Com suas instruções, direção espiritual, contribuição para a organização da vida comunitária e seu dinamismo da vida apostólica, ele orienta as irmãs a terem por base em suas vidas o lema: “Rezar e padecer”, como expressão da síntese vital de “oração e ação”, inspirada pela caridade.
Padre Leonardo Mazzuchi, filho espiritual de São Luís Guanella que o sucedeu na direção da congregação Servos da Caridade (SdC), afirma: “Dando nova vida a uma minúscula instituição local, Guanella pode colocar os alicerces dos seus almejados institutos”. Trata-se, portanto, de “vida nova”, de “alicerce”. Irmã Clara vê em Guanella, o enviado por Deus para o bem da comunidade e se confiou totalmente à sua direção espiritual. Padre Guanella tornou-se o seu guia.
A respeito do vínculo que se estabeleceu entre Clara e Guanella, Padre Piero Pellegrini fala da intensa colaboração prática, formativa e espiritual que permaneceu e se intensificou até a morte dela. Quando Clara teve que se afastar de seu “ótimo pai”, como frequentemente o chamava, seu único sentimento de pesar era o de estar distante dele, “não contando com a sua ajuda e direção”. Ela escrevia: “A mim, pelo menos, me acompanhe sempre sua bênção e, encontrando-me privada de sua querida presença, sua palavra e encorajamentos, desejo suprir por outro meio: O Senhor sabe tudo, conhece as necessidades, as penas do meu pobre coração e confio-me completamente ao Senhor” (L16).
Clara realiza o seu entregar-se a Deus pelas mãos do seu diretor espiritual: “Ofereço a minha vida primeiro a Deus, depois ao senhor, querido padre: faça de mim o que mais lhe agrada”.
Irmã Clara tornou-se logo o centro propulsor e amoroso daquela casa: das Irmãs, das postulantes, dos hóspedes, dos anciãos necessitados, das jovens operárias na cidade. De saúde delicada, ela trabalhou até o esgotamento. No outono de 1886, adoeceu dos pulmões. Esperando que o ar da terra natal pudesse ajudá-la, transportaram-na para Pianello, onde faleceu no dia 20 de abril de 1887. O próprio Padre Guanella promoveu a abertura da causa de sua beatificação. O processo informativo foi aberto em Como, no ano de 1912. Clara foi beatificada em 21 de abril de 1991. Seu corpo é venerado no Santuário do Sagrado Coração de Como, ao lado de São Luís Guanella.
Beata Clara Bosatta, rogai por nós!